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1º BIM Mandate Nacional: entrevista com Prof. Dr. Sergio Scheer

Em nosso último artigo, falamos da importância das políticas governamentais para impulsionar a adoção de BIM- Building Information Modeling no país. Em 2018, o Governo Federal avançou significativamente nesse sentido ao publicar a Estratégia Nacional de Disseminação do BIM- Estratégia BIM.BR, com o intuito de promover um ambiente adequado ao investimento em BIM e sua difusão no país. Quase 2 anos depois, no dia 2 de abril deste mês, foi publicado um novo Decreto, estabelecendo a utilização de BIM na execução de obras e serviços de engenharia de entidades da administração pública federal. 

Decreto 10.306/2020 publicado recentemente pode ser considerado o 1º BIM Mandate Nacional, ou seja, um plano de execução com instruções específicas sobre como a implantação deverá acontecer nas instituições governamentais. Diante desse novo marco, começamos a nos questionar acerca das implicações para o mercado da construção civil e dos próximos passos que estão por vir. Para esclarecer essas questões buscamos o Prof. Dr. Sergio Scheer, que gentilmente nos concedeu uma entrevista. 

Scheer tem um currículo bastante extenso, quase impossível de resumir nesta breve apresentação! Ele é graduado em Engenharia Civil, Mestre em Engenharia Civil e Doutor em Ciências da Computação, com atuação em pesquisas e ensino de aplicações computacionais, ambientes virtuais para projetos colaborativos, tecnologias da informação e da comunicação (TIC) e Building Information Modeling (BIM). Além de lecionar, também exerceu diversos cargos administrativos na Universidade Federal do Paraná e é membro de alguns comitês internacionais da sua área. Entre 2017 e 2018 ele fez parte do Comitê Estratégico de Implantação de BIM- CE-BIM do Governo Federal. 

Tivemos o prazer de conhecê-lo em nossa Pós Graduação de Gerenciamento BIM pelo SENAI/CIMATEC, em 2013, quando foi responsável por lecionar algumas disciplinas. Desde então, temos muita admiração pelo seu trabalho e entendemos ser umas das melhores pessoas para falar deste assunto.

Confira a entrevista na íntegra abaixo e não esqueça de deixar nos comentários o que achou:

NIB: Sabemos que o Brasil têm avançado bastante nos últimos anos no sentido de regulamentar e estimular a adoção de BIM no país. Um dos marcos regulatórios mais importantes nesse sentido foi a publicação da Estratégia BIM BR, instituída pelo Decreto nº 9.377, em 17 de maio de 2018. Quase dois anos depois, no dia 2 de abril de 2020, tivemos a publicação do Decreto 10.306/2020, considerado o 1º BIM Mandate Nacional. Poderia falar um pouco sobre os desdobramentos da Estratégia BIM BR e como o decreto está inserido nesse contexto?

Scheer: O novo decreto está no âmbito da Estratégia BIM.BR e trata de execução direta e indireta de obras e serviços de engenharia, execução realizada por órgãos e entidades da administração pública federal. Assim, serviços de arquitetura e engenharia dos programas-piloto, como nas forças armadas (Ministério da Defesa) e nas obras de infraestrutura (Ministério de Infraestrutura), estão incluídos. O contexto traçado na Estratégia BIM.BR é de implantação gradual e para empreendimentos relevantes. Nesse sentido deverão ser definidas as características de relevância como área construída, valor da obra, interesse institucional, por exemplo. A primeira fase se inicia em 2021 com atenção aos projetos, seguida da segunda fase incluindo a execução, a obra em si. E, na última fase, a partir de 2028, se incluem as atividades de gerenciamento da operação e manutenção dos empreendimentos públicos federais. O fato preponderante é que o Governo Federal é um grande demandante de projetos e obras. Nessa posição, vem estimulando a adoção e preparando o cenário desde 2009 em uma sequência de ações e programas de desenvolvimento e produtividade para a construção civil e relacionados com o BIM que foram promovidas através do antigo Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC) e com apoio da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI). Estas ações prosseguem hoje com o Ministério da Economia encabeçando a Estratégia BIM.BR e gerindo o processo de implantação de BIM conforme os decretos promulgados. O documento que norteia a Estratégia BIM.BR tem nove objetivos estratégicos e eles têm ações a serem executadas para o desenvolvimento efetivo da estratégia. Um exemplo é o objetivo que trata da capacitação em BIM, que destaca as ações de formação de recursos humanos na formação de profissionais na graduação, o delineamento das competências para gestores e servidores públicos e a capacitação para profissionais do mercado. Tudo isso para dar conta de usar e usar bem o processo BIM dando mais transparência aos recursos públicos e maior qualidade para os empreendimentos de construção. Vale a pena ler o documento da BIM.BR e conhecer mais sobre estas ações.

O novo decreto está no âmbito da Estratégia BIM.BR e trata de execução direta e indireta de obras e serviços de engenharia, execução realizada por órgãos e entidades da administração pública federal.

NIB: O Decreto 10.306/2020 estabelece a obrigatoriedade da utilização do BIM na execução de obras e serviços de engenharia vinculados especificamente aos Ministérios da Defesa e Infraestrutura, a ser implementado em três fases, a partir de jan. de 2021. Conforme o decreto, outros órgãos e entidades da administração pública federal poderão adotar as mesmas ações, porém permanecem isentos da obrigatoriedade. Na sua opinião, que outros projetos pilotos BIM poderão ser implementados por entidades governamentais dentro dos próximos anos? Quais os próximos passos?

Scheer: Entendo que todos os ministérios podem lançar mão desde desafio de implantação do BIM. Como grandes demandantes de projetos e obras, o Governo Federal tem o Ministério da Saúde e organismos como a Caixa Econômica Federal (aqui cabe mencionar que é preciso tratar de um “SINAPI-BIM” ou a adaptação/atualização possível!). Quem ganha é o Governo Federal e o cidadão! O BIM auxilia de maneira cabal a alcançar bons resultados de uso dos recursos orçamentários, com projetos e obras entregues com qualidade e sendo executadas no prazo e dentro do orçamento previsto. Se olharmos os nove objetivos da Estratégia BIM.BR, devem ser viabilizadas as ações elencadas. Como a que mencionei de estímulo à capacitação em BIM que é de fato preponderante: o Governo e o mercado precisam de profissionais preparados para demandar e entregar obras em BIM.

Saindo do âmbito do poder público federal, mas por estímulo das ações federais de disseminação de BIM em certo modo, aqui vale mencionar os esforços pioneiros em BIM nos estados de Santa Catarina e Paraná. Nesses dois estados pude acompanhar o trabalho de grupos aguerridos de servidores e apoiadores. Em especial, no Paraná pude ajudar um mais de perto a partir de um termo de cooperação técnica iniciado em 2015 da UFPR com a Secretaria de Infraestrutura e Logística (SEIL – DGPO) e com diversos ações e resultados com o LaBIM. Um BIM mandate paranaense (Caderno 11 – caderno BIM de especificações técnicas para contratação de projetos em BIM) foi lançado em 2018 após consulta pública e ajustes. Sobretudo, no final do ano passado o governador do Paraná assinou um decreto com a estratégia paranaense de implantação do BIM (Estratégia BIM.PR) para todos os empreendimentos de âmbito do poder público estadual a partir de 2022 (Decreto Estadual 3080/2019).

Entendo que todos os ministérios podem lançar mão desde desafio de implantação do BIM. (…) Saindo do âmbito do poder público federal, mas por estímulo das ações federais de disseminação de BIM em certo modo, aqui vale mencionar os esforços pioneiros em BIM nos estados de Santa Catarina e Paraná. Nesses dois estados pude acompanhar o trabalho de grupos aguerridos de servidores e apoiadores.

NIB: Um dos objetivos da Estratégia BIM BR é criar condições favoráveis para o investimento público e privado em BIM, a exemplo de programas de incentivo focados em micro e pequenas empresas. Aqui no nosso estado, o SEBRAE Bahia incluiu serviços de implantação de BIM em seu programa de consultorias com subsídio para MPEs (SEBRAETEC). Na sua opinião, podemos considerar essa iniciativa parte de um movimento nacional? Que outros incentivos podemos prever nesse sentido?

Scheer: O SEBRAE e o SENAI já estão fazendo ações na temática do BIM através de suas regionais (nos estados). No caso do Paraná, em âmbito nacional, o Instituto Senai de Tecnologia que trata de construção civil é localizado na cidade de Ponta Grossa e lá se desenvolveu um laboratório BIM com prestação de serviços. Um exemplo é a implantação de BIM junto ao sistema de controle de tráfego aéreo (CISCEA) do Ministério da Aeronáutica. Acredito que com a disseminação do BIM a partir da estratégia nacional, o SEBRAE Nacional e o SENAI Departamento Nacional (DN) podem aumentar os recursos destinados à disseminação e implantação de BIM em empresas. Novamente, um dos objetivos estratégicos da BIM.BR é o de criar condições favoráveis para o investimento público e privado (terceiro objetivo estratégico). Neste objetivo, as ações são de adaptação de linhas de financiamento, criação de programas de incentivo ao investimento nas micro e pequenas empresas (95% das empresas da área de construção…), esclarecimento sobre os requisitos BIM nos processos licitatórios do Governo Federal e promoção de articulação internacional para atração de investimentos. À época de elaboração da Estratégia BIM.BR, o BNDES e a Caixa participavam das discussões de formulação de ações em um grupo de trabalho sobre infraestrutura. Também a Anatel fazia parte, posto que neste grupo questões de disponibilidade de acesso a financiamento para hardware, software e de para acesso aos serviços em nuvem (Internet e banda larga) eram o tema. É preciso retomar estas discussões.

Acredito que com a disseminação do BIM a partir da estratégia nacional, o SEBRAE Nacional e o SENAI Departamento Nacional (DN) podem aumentar os recursos destinados à disseminação e implantação de BIM em empresas.

NIB: Na sua opinião, quais as implicações práticas da publicação do 1º BIM Mandate Nacional para a atividade profissional de engenheiros/ arquitetos?

Scheer: O Governo Federal vai aumentar sua demanda por projetos em BIM e os governos estaduais vão seguir o exemplo. E algumas prefeituras já estão fazendo seus esforços para conseguir ter seus planos de implantação. O mercado vai precisar uma quantidade razoável de profissionais versados em BIM. Não há no momento uma “capacidade instalada”! Sugiro aos não versados em BIM que procurem capacitação, imediatamente!

O mercado vai precisar uma quantidade razoável de profissionais versados em BIM. Não há no momento uma “capacidade instalada”! Sugiro aos não versados em BIM que procurem capacitação, imediatamente!

NIB: Na sua opinião, quais os maiores obstáculos para a execução da Estratégia BIM BR atualmente?

Scheer: Uma lista em uma mão: a) falta de capacitação de servidores públicos como demandantes de BIM; b) no mercado há falta de profissionais e empresas em quantidade e qualidade para atender a demanda das entidades públicas; c) dificuldades de investimento pelas empresas de menor porte; d) decretos, leis e regulamentos para licitação e contratação de serviços que não são adequados ou aderentes à contratação de projetos em BIM (buscar solucionar isto também é parte das ações previstas na BIM.BR); e) diferentes sistemas de classificação de atividades e insumos pelos órgãos públicos – não há uma norma única que agilize… a ABNT está quase completando a 15.965 que pode ser um impulsionador na revisão pelos órgãos públicos e adoção das normas brasileiras para BIM. Mas, nem tudo são obstáculos. Sobretudo, apesar do momento genuinamente difícil e atípico (pandemia e etc.) vejo que estamos em momento muito positivo de disseminação e adoção para o BIM. Afinal, com projetos e obras de qualidade e dentro do prazo e do cronograma, ganham os governos e sobretudo ganha o cidadão!

Mas, nem tudo são obstáculos. Sobretudo, apesar do momento genuinamente difícil e atípico (pandemia e etc.) vejo que estamos em momento muito positivo de disseminação e adoção para o BIM. Afinal, com projetos e obras de qualidade e dentro do prazo e do cronograma, ganham os governos e sobretudo ganha o cidadão!

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